sexta-feira, 7 de abril de 2023

Formação de Professores e Ensino de História.

 

Formação de Professores e Ensino de História: Perspectivas e Desafios

 

Falar em formação docente e ensino de História na atual conjuntura sócio/histórico brasileira significa refletir sobre a dinâmica social e a sua relação direta com o processo de formação e atuação profissional do professor, pois esta dinâmica, composta pelas questões sociais, políticas, econômicas, culturais, pelos conflitos e contradições, pelas rupturas, pelas lutas de classes, etc. estão diretamente ligadas ao processo de formação do alunado que as escolas recebem e que os professores se relacionam na sua prática pedagógica diária.

Abordar essas questões, compreendendo-as como resultado da dinâmica social, significa tocar no âmago dos inúmeros problemas que a educação brasileira vem vivenciando cada vez com maior intensidade.

Na atual conjuntura educacional, não é mais possível continuar vendo a escola como um campo de atuação das manifestações culturais dominantes, uma vez que a escola tem como principio básico a formação dos cidadãos nas suas concepções mais amplas e democráticas, pois vivemos numa sociedade em que as manifestações políticas e culturais são múltiplas e variadas e, nesse contexto, se faz necessário a construção de uma prática pedagógica que privilegie as diferenças existentes no próprio ambiente de sala de aula.

As diferenças existentes são produto de uma sociedade culturalmente multifacetada e permeada pelas mais diversas realidades sociais, fruto de um contexto histórico construído sobre alicerces sociais discriminatórios e excludentes, onde os valores das camadas dominantes sempre estiveram em primeiro plano, impedindo a construção de uma sociedade fundada na diversidade e na democracia.

Para Vasconcelos

A compreensão desse processo histórico nos aponta para a necessidade de alterar a situação até hoje existente, no sentido de colocar-se a serviço dos interesses das camadas e de um projeto de transformação social. (VASCONCELOS, 2005:117).

Nesse processo, o professor de História ocupa posição central na análise dessa conjuntura e na possibilidade de construir situações concretas de superação através da prática pedagógica por ele desenvolvida no interior do espaço escolar. Essa superação não deve ser um trabalho solitário ou anônimo, mas fundamentado na construção de um trabalho que envolva o coletivo escolar, principalmente o corpo docente, através de um trabalho de conscientização dos mesmos sobre a importância e o poder da ação pedagógica por eles desenvolvida em seu cotidiano. Assim, através de um trabalho coletivo, as possibilidades de avanço e sucesso desse empenho obterão resultados mais consistentes.

         Historicamente, a prática educativa esteve condicionada pelo contexto histórico e a escola como “representante oficial” dos interesses dominantes. A superação dos problemas didáticos e metodológicos deve ser uma preocupação constante do professor de História, pois as mesmas são vitais no processo de ensino e aprendizagem realizada em sala de aula. No entanto, essa superação só ocorrerá através de uma busca constante pela atualização e formação continuada do professor, aliada a uma análise/reflexão crítica e cotidiana da sua própria prática pedagógica.

Segundo Fonseca, é preciso pensar a disciplina de história como:

(...) disciplina fundamentalmente educativa, formativa, emancipadora e libertadora. A história tem como papel central a formação da consciência histórica dos homens, possibilitando a construção de identidades, a elucidação do vivido, a intervenção social e praxes individual e coletiva (2003: 89).

O papel de “formadora, emancipadora e libertadora” da disciplina de História, só possuirá eficácia através do trabalho realizado pelo professor em sala de aula e sua interação com os alunos. Por isso a importância do mesmo em buscar uma aproximação com as questões ensinadas e a realidade vivida pelo público escolar. Levar em consideração a diversidade social e cultural existente em cada realidade escolar e adequar as abordagens realizadas em sala de aula a estas realidades, não vai resolver todos os problemas, mas é o primeiro e mais importante passo a ser dado por todos aqueles que acreditam na inclusão e na luta pela democracia social.

Para que isso seja possível,

(...) o professor de história, com sua maneira própria de ser, pensar, agir e ensinar, transforma seu conjunto de complexos saberes em conhecimentos efetivamente ensináveis, faz com que o aluno não apenas compreenda, mas assimile, incorpore e reflita sobre esses ensinamentos de variadas formas. É uma reinvenção permanente (FONSECA, 2003:71).

A atuação pedagógica do educador traz consigo uma gama de significados e simbolismos produzido na sua trajetória de vida. Essas representações irão atuar de forma significativa na vida e na formação do educando, através da relação deste com o educador e seu trabalho.

Nesse contexto, a prática pedagógica do professor de história

(...) ajuda o aluno a adquirir as ferramentas de trabalho necessárias para aprender a pensar historicamente, o saber-fazer, o saber-fazer-bem, lançando os germes do histórico. Ele é o responsável por ensinar ao aluno como captar e valorizar a diversidade das fontes e dos pontos de vista históricos, levando-o a reconstruir, por adução, o percurso da narrativa histórica. Ao professor cabe ensinar ao aluno como levantar problemas, procurando transformar, em cada aula de história, temas e problemáticas em narrativas históricas (SCHMIDT e CAINELLI, 2004:30).

Assim, a aula de história possibilita a construção do saber histórico através da relação interativa entre educador e educando, transformando essa prática em ato político, no sentido de transformação consciente do fazer histórico. Nesse contexto, salienta-se a importância do professor ser também um pesquisador e produtor do conhecimento e não apenas um mero executor de saberes já produzidos.

Nesse processo, a didática possui papel relevante no sentido de possibilitar a transformação de um saber histórico em um saber compreensível e atuante para a compreensão do aluno, tornando-o capacitado a não só conhecer o saber histórico, mas também de torná-lo um participante ativo do pensar e do narrar os fatos históricos.

Assim, a didática é elemento fundamental nesse processo de transformação daquilo que se ensina e do significado histórico/social do que se ensina. A história possui significados que precisam ser compreendidos pelos educandos para que haja transformação.

Nesse processo, não podemos esquecer da realidade social, política, econômica e cultural em que vivemos e da realidade encontrada em cada escola e, consequentemente, em cada sala de aula. Torna-se importante salientar que cada aula é única e que a na realidade da sala de aula, possuímos alunos reais, concretos, afetados pelas influências históricas, sociais, políticas, econômicas, culturais, etc., e estas influências atuam sobre seu modo de ser, ver, compreender e atuar no mundo.

Nesse sentido, precisamos conhecer a realidade multifacetada e compreender como as mesmas são produzidas para, a partir dessa compreensão, criar mecanismos que possam ser eficazes e condizentes com a realidade vivenciada por cada professor em sua atuação profissional, pois, é para esses alunos reais que precisamos direcionar nossa prática pedagógica, vislumbrando o processo de inclusão e de emancipação.

Um educador, que se preocupe com que a sua prática educacional esteja voltada para a transformação, não poderá agir inconsciente e irrefletidamente. Cada passo de sua ação deverá estar marcado por uma decisão clara e explícita do que está fazendo e para onde possivelmente está encaminhando os resultados de sua ação. A avaliação, neste contexto, terá de ser uma atividade racionalmente definida, dentro de um encaminhamento político e decisório a favor da competência de todos para a participação democrática da vida social (Luckesi, 1984: 46).

No ambiente educacional ingressam alunos de diferentes origens, culturas, níveis de desenvolvimento intelectual e idades. Essas diferenças representam as experiências de vida e conhecimentos adquiridos num meio sócio-cultural distinto para cada aluno. A construção do conhecimento ocorre através da interação do sujeito com a sociedade/grupo em que está inserido. Nesta, cada sujeito participa de uma vivência específica, produzindo com isso, um acúmulo de conhecimentos/saberes também específicos.

As individualidades representam as diferenças culturais que existem em uma determinada sociedade. Não valorizar essas diferenças que cada aluno traz consigo num processo de ensino e aprendizagem seria, no nosso entendimento, um modo de encaminhar os sujeitos para a exclusão.

Como lembra Sant’Ana:

É fundamental ver o aluno como um ser social e político sujeito do seu próprio desenvolvimento. O professor não precisa mudar suas técnicas, seus métodos de trabalho, precisa, isto sim, ver o aluno como alguém capaz de estabelecer uma relação cognitiva e afetiva com o meio circundante, mantendo uma ação interativa capaz de uma transformação libertadora (1995:26).

O ensino de História torna-se fundamental para a compreensão dos fatos históricos e para a sua articulação com a história/realidade presente, uma vez que o presente é fruto da dinâmica dos acontecimentos históricos do passado. Nesse sentido, o ensino de História possui papel relevante na superação da exclusão social, na construção da cidadania e na emancipação social e política dos sujeitos históricos. Em suma, ensinar história é agir em função de metas e objetivos conscientemente perseguidos no interior de um contexto de atuação educacional, permeada pelos desafios cotidianos e pela burocratização do ensino.

 

 

PROJETO DE PESQUISA

 

 

 

 

 


UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

FACULDADE DE HISTÓRIA

DICIPLINA: ESTÁGIO SUPERVISIONADO I

PROFª.DRª.: WILMA DE NAZARÉ BAÍA COELHO

 

 

 

 

 

 

 

 

PROJETO DE PESQUISA

 

 

 

 

 

 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


                                                                                               

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Parauapebas, outubro 2009

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

FACULDADE DE HISTÓRIA

DICIPLINA: ESTÁGIO SUPERVISIONADO I

PROFª.DR. WILMA BAÍA COELHO

ACADÊMICOS: LUÍS DA SILVA PEREIRA E MANOEL OLIVEIRA DA SILVA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SEGUNDA AVALIAÇÃO

 

Projeto realizado para a disciplina de Estágio Supervisionado I, sob a orientação da Profª.drª. Wilma Baía Coelho.

 

 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Parauapebas, outubro 2009

SUMÁRIO

 

 

 

1 DEFINIÇÃO DO TEMA....................................................................................................4

2 OBJETO...............................................................................................................................4

3 INTRODUÇÃO...................................................................................................................4

4 JUSTIFICATIVA................................................................................................................5

5 PROBLEMÁTICA..............................................................................................................6

6 OBJETIVOS........................................................................................................................6

7 DESENVOLVIMENTO.....................................................................................................6

8 CRONOGRAMA...............................................................................................................10

9 REFERÊNCIAS.................................................................................................................11

 

 

 

                                                                                               

                                                              

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1. DEFINIÇÃO DO TEMA

 

Agente escolar: transposição didática

 

 

 

 

 

 

 

2. OBJE TO

 

A transposição didática do professor de história de 5ª e 6ª séries da Escola Municipal de Ensino Fundamental Eldorado.

 

 

3. INTRODUÇÃO

 

Caixa de Texto: Segundo uma superstição amplamente difundida, todas as traduções traem os seus inigualáveis originais. Isto é expresso pelo conhecido trocadilho ‘traduttore, traditore’, que se julga irretorquível. Sendo esse trocadilho bastante popular, há de existir um núcleo de verdade, um âmago de verdade, oculto em seu interior.                  
                                                          Jorge Luis Borges

 

 

 

 

 

                                                                               

                                                                                                           

         Pretende-se com essa pesquisa, fazer uma análise de cunho crítico metodológico do ensino de História de 5ª e 6ª séries da Escola Eldorado. Visto que, o conhecimento histórico, como área científica tem influenciado o ensino e afetado os conteúdos e os métodos tradicionais de aprendizagem. (PCN, H-G. p.31) – buscaremos levantar informações de como esse conhecimento histórico está sendo transmitido aos alunos, verificando a transposição didática dos professores, uma vez que, os processos transpositivos didáticos - e, mais genericamente, institucionais – são “a mola essencial da vida dos saberes, de sua disseminação e de sua funcionalidade adequada”. (Chevallard, 1991, p. 214 - In Marta Marandino - A pesquisa educacional e a produção de saberes nos museus de ciências, p. 165).

         Segundo o autor, sem esse processo não se consegue fazer aflorar um bom nível de conhecimento. A negligência na produção da transposição didática pode soar como fator criminoso no processo de produção do saber escolar. A compreensão dos mecanismos socio-culturais e pedagógicos que entram em jogo no processo de construção dos saberes históricos escolares torna-se cada vez mais indispensável quando se trata de analisar e avaliar o ensino desta disciplina.

         No bojo da discussão das mudanças do modo de trabalhar história em sala de aula, vemos que a cadeia de transposição didática implicada (Chevallard, 1986) envolve diferentes profissionais com competências distintas. Dentro da instituição escolar, a colocação em prática dos princípios idealizados e prescritos por outras esferas é, porém, atribuída prioritariamente ao professor. É necessário estar bastante consciente de que trabalhar História impõe um alto nível de exigência ao profissional professor. De um rol de conteúdos isolados, aprendidos pela repetição oral e memorização dos textos escritos, que era, segundo os parâmetros curriculares nacionais, a forma de ensinar história, (PCN, vl 5, p. 21) o professor deve ensinar práticas variadas de produção e compreensão de gêneros orais e escritos, tais como se dão no espaço extra escolar, e que esse mestre promova situações de analise e reflexão sobre seu objeto de estudo.

         O reconhecimento e a compreensão dessas duas dimensões do saber escolar - científico e escolar - tornam-se, pois, fundamentais para se repensar certos desafios que se colocam hoje para o ensino de história, em particular os que se referem às questões relativas às propostas inovadoras contidas nas reformas curriculares, bem como a sua recepção pelos professores.

 

 

 4. JUSTIFICATIVA

 

         A questão da transposição do conhecimento nos diferentes espaços tem sido analisada por vários autores nos campos da educação e do ensino da ciência (Marandino – 2005). Em face desses acontecimentos percebemos uma necessidade de observarmos como se dá a construção do conhecimento histórico na escola eldorado nas turmas de história de 5ª e 6ª séries, para tanto observaremos a transposição didática feita pelos professores nesse campo de conhecimento científico para a compreensão do processo do saber ocorrido nas referidas séries.

         Com essa pesquisa pretende-se verificar como o saber científico está sendo transformado em saber escolar, e como se dá essa transformação e sua transmissão a seu público alvo.  

         Não é objetivo dessa pesquisa, conhecer a história como disciplina escolar, mas sim identificar as possíveis deficiências existentes na construção desse conhecimento.

 

5. PROBLEMÁTICA

 

         Os professores de 5ª e 6ª séries da Escola Eldorado estão aptos a fazer a transposição didática de maneira adequada, que possa suprir as necessidades e realidades dos alunos? Estariam os professores da referida escola, despidos do arcaísmo e sintonizados com os métodos atualizados para a transmissão do conhecimento histórico? Ou revertidos de um tradicionalismo que não os permitam a absorver o novo? Ou a formação tanto inicial como contínua inadequada, ou obsoleta, não permitiria a absorção das mudanças propostas?  

 

6. OBJETIVOS:

 

Geral:

ü  Analisar a transposição didática do professor de história de 5ª e 6ª séries da Escola eldorado.

 

 

Específico:

ü  Demonstrar o processo de transmissão do conhecimento do professor;

ü  Evidenciar a capacidade que o professor tem na identificação da problemática envolvida no seu fazer pedagógico;

ü  Constatar que para a educação ser de qualidade é necessário que o educador esteja em constante capacitação.

 

 

7. DESENVOLVIMENTO

 

         O termo transposição implica no reconhecimento da diferenciação entre saber acadêmico e saber escolar, considerados como saberes específicos de natureza e funções sociais distintas, nem sempre evidentes nas análises sobre a dimensão cognitiva do processo de ensino aprendizagem. Uma breve análise das propostas curriculares de história que surgiram a partir da década de 80 permite perceber que a tendência é a existência da lógica que afirma a necessidade de aproximar os saberes ensinados na escola com novas historiografias de forma automática (Carmem Teresa Gabriel, Usos e abusos do conceito de transposição didática).

         Chevallard defende a tese de que transposição didática é a condição essencial imposta pelos imperativos didáticos ao elemento saber, consiste na sua transformação para que ele possa se tornar apto a ser ensinado. O conceito de transposição didática surge assim para mostrar, ou explicar esse processo obrigatório da transformação dos saberes científicos. Há um distanciamento dos saberes, e a transposição vem justamente para nos fazer ver esse distanciamento e nunca minimizá-lo. Para Chevallard, os processos transpositivos didáticos são essenciais para estes saberes, a manipulação transpositiva é condição fundamental para o funcionamento da sociedade.         

         Na visão de Chevallard, as transformações que os saberes sofrem no âmbito de ensino são de grande relevância na transformação do conhecimento científico com fins de ensino e divulgação, não constitui simples “adaptação” de conhecimento. Marandino ao citar Chevallard diz que um dos aspectos mais interessantes da teoria da transposição didática, segundo ele, foi a determinação de alguns parâmetros que caracterizaram este processo. De acordo com o autor, na transformação do saber sábio para o saber ensinado ocorrem:

a)      Descontemporalização – é quando o saber ensinado é exilado de sua origem e separado de sua produção histórica na esfera do saber sábio.

Em outras palavras, o saber ensinado é abstraído do saber sábio e se torna objeto de ensino para o educando. Isso tudo, segundo Chevallard, se dá na noosfera, que é o lugar onde acontece esse processo de transformação do saber sábio para o saber escolar.

b)      Naturalização – o saber ensinado possui uma evidência incontestável das ‘coisas naturais’, no sentido de uma natureza dada; ou seja, o objeto de conhecimento perde sua característica científica, com a finalidade da absorção desse saber, agora modificado, para que os educando possam assimilar com mais facilidade seu conteúdo;

c)      Descontextualização – aqui, o saber sábio é tirado do seu contexto e, em seguida recontextualizado, mas de maneira diferente; assim, nesse processo de descontextualização, alguma coisa continua fora do contexto, pois já não se identifica com o texto científico, com aquela rede de questões e problemas como no original. Fica então modificado seu sentido original;

d)      Despersonalização – nesse processo de despersonalização, Chevallard enfatiza que todo saber é identificado com seu autor, quando esse saber é compartilhado, segundo ele, este saber deixa de ser personalizado, passa a ser um conhecimento social e um requisito para sua publicidade.

         Develay (1987), em seu trabalho sobre transposição didática do conceito de memória, recorre aos parâmetros de Chevallard, mas chama a atenção para outros. Além da despersonalização, destaca a ‘dessincretização’ – que redunda na divisão entre a prática teórica e aquela ensinada, a qual não revela, por exemplo, a interdisciplinaridade existente na produção da ciência -, e a ‘programação da aquisição do saber’-correspondente ao controle exercido pela seriação progressiva no ensino. (Marandino, A pesquisa educacional, p.171).

         Quando o saber é transformado em saber escolar, segundo Chevallard, um novo saber é produzido e isso indica que no espaço escolar, existe produção de conhecimento, desmistificando assim, a idéia de que produção de conhecimento só se dá em instituições de pesquisa e nas universidades.       

         Com base nos fatores acima mencionados, buscaremos nesse trabalho observar como ocorre a transposição didática dos professores de historia de 5ª e 6ª séries da Escola Eldorado.

         A pesquisa que faremos terá uma abordagem metodológica verificando abertamente a maneira pela qual o conhecimento é transmitido aos alunos. O ensino de História é um processo em contínua transformação e adaptação à realidade dos educando e da sociedade como um todo. Nesse processo, é indispensável que o professor acompanhe as transformações e procure continuamente se adaptar às novas demandas do ensino. Para isso o professor deve procurar desenvolver novas competências para ensinar.

         Fatores como a falta de formação do professor de História favorece em muito a deficiência do ensino e o da aprendizagem, haja visto que ele não possui embasamento teórico (que favoreça a prática mais acentuada e eficaz), por conseguinte lhe falta estímulo para inserir dentro da sala de aula o hábito de levar o aluno a pensar, refletir e formular conceitos e problemáticas.

         É fundamental para o estudante que está começando a ler o mundo humano, conhecer a diversidade de ambientes, habitações, modos de vida, estilos de arte ou formas de organização de trabalho, para compreender de modo mais crítico a sua própria época e o espaço em seu contorno (PCN, H – G, p. 91). Cabe ao professor, providenciar o ambiente propício para que o aluno possa desenvolver seu potencial cognitivo de maneira que seja capaz de dialogar com o mundo ao seu redor, (...) assim, além de identificarem significações pessoais para as atividades, os alunos podem enxergar a si mesmos como sujeitos participativos e compromissados com a História e com as realidades presente e futura (PCN, H-G, p. 95).

         É necessário que seja criada uma postura de tomada de consciência do progresso científico, da visão de uma sociedade onde se valorize a dignidade da pessoa enquanto agente de transformação. Essa postura tem em primeiro plano, que partir do cume da estrutura educacional. A educação escolar só poderá se tornar eficiente quando ela for valorizada, quando houver a percepção de que o educador, a sala de aula e os alunos são partes de uma mesma equação. Há dificuldades dos responsáveis a nível de escola (diretor, professores, orientadores, supervisores), em elaborar um planejamento integrado que contenha objetivos, atividades significativas e a formulação de projetos integrados, respeitando a individualidade do aluno e seu potencial.

          Os professores, em sua maioria, devido à escassez de tempo por ter que assumirem mais de um emprego, ficam às vezes sem oportunidades de atualização e aprimoramento e até uma aproximação mais específica com seus alunos. Em contato com a realidade educacional, ainda encontramos uma grande parte de educadores voltados para um ensino e aprendizagem artificiais, abstratos e não condizentes com a realidade que envolve o aluno. O nosso compromisso, como alunos do curso de História, é grande, e para tal depositamos nossa confiança nos educadores e nos acadêmicos que são os verdadeiros agentes de mudança.

         Nessa perspectiva, é fundamental que assumamos nossas responsabilidades, sem esperar que as esferas administrativas superiores tomem essa iniciativa. A melhoria da qualidade da formação profissional e a valorização do trabalho pedagógico requerem a forte articulação entre instituições formadoras. A formação profissional consciente e crítica implicam, também, na indissociabilidade entre a formação inicial e a formação continuada.

         A transformação das práticas de ensino de história merece uma atenção maior por parte dos que fazem e discutem as políticas de formação e atuação dos profissionais. Parece-nos inegável a complexificação daquela tarefa docente, em função das reconceituações sobre história e seu ensino que vivemos nos últimos anos. Por um lado, as expectativas sociais em torno da ação docente tornaram-se muito mais exigentes, pois é necessário se pensar uma escola que queira formar cidadãos pensantes, e não somente pessoas “papagaios”, que somente são capazes de repetir aquilo que memorizou através dos métodos antigos de se ensinar história. Por outro lado, este fazer pedagógico, pressupõe não apenas desenvolver em sala de aula debates orais que permitam a expressão do educando, sua conscientização sobre processos sociais e humanos. A proposta é vislumbrar o lugar da construção que, em outras palavras, é o lugar da criatividade, um dos passos mais revolucionários que um professor pode dar.

         Educar não é uma mera transferência de conhecimentos, mas sim conscientização e testemunho de vida, senão não terá eficácia (PAULO FREIRE, 1997). Igualmente, para ele, educar é como viver, exige a consciência do inacabado porque a “História em que me faço com os outros (...) é um tempo de possibilidades e não de determinismo” (p.58).No entanto, tempo de possibilidades condicionadas pela herança do genético, social, cultural e histórico que faz dos homens e das mulheres seres responsáveis, sobretudo quando a “decência pode ser negada e a liberdade ofendida e recusada” (p.62). Segundo Freire, “o educador que ‘castra’ a curiosidade do educando em nome da eficácia da memorização mecânica do ensino dos conteúdos, tolhe a liberdade do educando, e a sua capacidade de aventurar-se. Não forma, domestica” (p.63).

          É preciso deixar o aluno buscar respostas para suas inquietações, não devemos dar-lhe o peixe, mas sim, a possibilidade de pescá-lo. Eu iria mais longe ainda, e diria que devemos dar-lhe apenas uma vara de pescar e deixá-lo à vontade para pegar seus próprios peixes. A escola deve trabalhar o processo de transformação do conhecimento de modo a não deixar que o educando se torne um ser incapacitado de raciocinar por si só. Freire continua dizendo que não devemos desrespeitar a autonomia a dignidade e identidade do aluno, caso contrário, o ensino tornar-se-á “inautêntico, palavreado vazio e inoperante” (p.69).

         A despeito de tudo que até aqui foi mencionado, ressaltamos que a nossa pretensão é de fazer uma pesquisa a respeito de como está sendo realizada a transposição didática (transformação do saber científico em saber escolar), na disciplina de História nas turmas de 5ª e 6ª séries na Escola Eldorado. Não pretendemos com isso mudar a maneira pela qual os profissionais da educação estão se utilizando, em suas práticas pedagógicas, porém, é de muita relevância descobrir se os métodos pelos quais essa transmissão de conhecimento está sendo realizada possuem conectivo com aquilo que se quer alcançar.

         Pois como já sabemos, a transposição didática é sem dúvida uma maneira muito eficaz de se transmitir o conhecimento histórico aos educando.

 

 

8. CRONOGRAMA

        

         Esse trabalho contará com uma pesquisa de campo em educação com carga horária de 62 h de observação em sala de aula. Usaremos como recursos didáticos para a pesquisa apenas caneta e caderno para anotações daquilo que julgarmos importante, ou que tenha alguma relevância para o nosso objeto de pesquisa, que se iniciará no dia        19 de outubro ao dia 30 de novembro de 2009. Serão observadas as turmas de 5ª e 6ª series nas aulas de história, nos turnos manhã e tarde.

 

Observação no local da pesquisa

De19/10 a 30/11/2009

Manhã

Tarde

 

 

 

9. REFERÊNCIAS

 

MARANDINO, Marta.: A pesquisa educacional e a produção de saberes nos museus de ciência. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v. 12 (suplementos), p. 161- 81, 2005.

MARANDINO, Marta.: Transposição ou recontextualização? Sobre a produção de saberes na educação em museus de ciências-Revista Brasileira de Educação Nº. 26, 2004.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1997-p. 165.

SCHMIDT, Maria Auxiliadora M. Santos. História com Pedagogia: a contribuição de Jonathas Serrano na construção do código disciplinar da História no Brasil. In. Revista Brasileira de História. Produção e divulgação de saberes históricos e pedagógicos. São Paulo: ANPUH/FAPESP, n. 48, agosto/2004 a julho/2005, pp.189-212.

Parâmetros Curriculares Nacionais: história, geografia/Secretaria de Educação fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1997.

GABRIEL, Carmen Teresa. Usos e abusos do conceito de transposição didática.

PERRENOUD, Philippe. O ensino da história e as novas competências para ensinar. 2007.

 

 

 

 

 

 

 

 

Análise de Conteúdo:

 

Análise de Conteúdo:
a proposta de Laurence Bardin

 

Este trabalho tem por objetivo apresentar a análise de conteúdo como uma das formas possíveis de tratamento de dados em pesquisa. A proposta aqui discutida é da professora da Universidade de Paris V, Laurence Bardin.

Situando a análise de conteúdo na história, vemos que seu berço foi nos Estados Unidos como um instrumento de análise das comunicações, há mais de meio século. Porém, a interpretação de textos já era abordada há muito tempo e de diversas formas, como na hermenêutica, que é a arte de interpretar os textos sagrados ou misteriosos.

Então, o que pode ser interpretado? Bardin (1977) nos responde que:

“Mensagens obscuras que exigem uma interpretação, mensagens com um duplo sentido cuja significação profunda só pode surgir depois de uma observação cuidadosa ou de uma intuição carismática.
Por detrás do discurso aparente, geralmente simbólico e polissêmico, esconde-se um sentido que convém desvendar.”

O pesquisador que trabalha seus dados a partir da perspectiva da análise de conteúdo está sempre procurando um texto atrás de outro texto, um texto que não está aparente já na primeira leitura e que precisa de uma metodologia para ser desvendado.

A análise de conteúdo percorreu um caminho por diversas fontes de dados: as notícias dos jornais, os discursos dos políticos, as cartas trocadas, os anúncios publicitários, os romances autobiográficos, os relatórios oficiais. No início desse caminho, a objetividade da análise era perseguida com empenho. Baldiwn, citado por Bardin (1977), numa tentativa de análise das estruturas de personalidade pelo estudo sistemático de cartas, propõe uma das primeiras tentativas de análise de contingência, ou seja, análise de co-ocorrências de associações ou exclusões de palavras ou temas presentes no material de análise. Aos poucos, a análise de conteúdo foi interessando pesquisadores da lingüística, da etnologia, da história, da psiquiatria, da psicanálise, que vieram para somar com suas pesquisas aos trabalhos de colegas nas áreas da psicologia, das ciências políticas e do jornalismo.

Surgiram as discussões sobre as diferenças que existiriam na análise de conteúdo se fosse enfatizada a abordagem qualitativa ou quantitativa nas pesquisas. Na análise quantitativa, o que serviria de referencial seria a freqüência com que surgem certas características do conteúdo. Na análise qualitativa seria a presença ou a ausência de uma dada característica de conteúdo ou de um conjunto de características num determinado fragmento de mensagem que é tomado em consideração. Moreira (2003) traz essa discussão a partir das posições dos autores Souza Filho e Vala.

Aos poucos, a exigência da objetividade tornou-se menos rígida e se aceitou a combinação da compreensão clínica com a contribuição estatística. A análise de conteúdo começou a ser vista não apenas com um alcance descritivo, mas com um objetivo de inferência, ou seja, pelos resultados da análise, poder-se-ia regressar às causas.

Bardin (1977) nos conta que a partir 1960 três fenômenos afetaram a investigação e a prática da análise de conteúdo: (1) o recurso de programas de computadores; (2) o interesse pelos estudos relacionados à comunicação não verbal; (3) a inviabilidade de precisão dos trabalhos lingüísticos. Os programas de computadores permitiram uma análise mais detalhada dos textos, no que diz respeito à sua mensuração, ou seja, à freqüência de uma determinada unidade de análise; técnicas estatísticas avançadas puderam ser aplicadas. A semiologia começou, também, a explorar o campo de sistema de signos não lingüísticos, campo até então inexplorado: a imagem, a tipografia e a música surgiram como possibilidades de serem trabalhadas através da abordagem da análise de conteúdo. Da mesma forma, os fundamentos teóricos desses novos campos (estruturalismo, psicanálise, por exemplo) começaram a questionar o movimento relativamente linear da análise de conteúdo. Já com a lingüística, surge um questionamento, visto que a análise de conteúdo é confrontada com uma disciplina solidamente constituída e metodologicamente confirmada, mas com finalidade diferente.

Há na análise de conteúdo dois pólos: a rigorosidade e a necessidade de ir além das aparências. Metodologicamente, existem duas orientações que ao mesmo tempo em que se confrontam também se complementam: a verificação prudente ou a interpretação brilhante.

Para Bardin (1977) a análise de conteúdo de mensagens tem duas funções:

· Uma função heurística:

- A análise de conteúdo enriquece a tentativa exploratória, aumenta a propensão à descoberta; é a análise de conteúdo para ‘ver o que dá’;

· Uma função de administração da prova:

- Hipóteses sob a forma de questões ou de afirmações provisórias servindo de diretrizes, apelarão para o método de análise sistemática para serem verificadas no sentido de uma confirmação ou de uma infirmação; é a análise de conteúdo para ‘servir de prova’.

Na prática essas duas funções se complementam. Bardin (1977) afirma que:

“A análise de conteúdo (seria melhor falar de análises de conteúdo) é um método muito empírico, dependente do tipo de ‘fala’ a que se dedica e do tipo de interpretação que se pretende como objetivo. Não existe o pronto-a-vestir em análise de conteúdo, mas somente algumas regras de base, por vezes, dificilmente transponíveis. A técnica de análise de conteúdo adequada ao domínio e ao objetivo pretendidos, tem que ser reinventada a cada momento, exceto para usos simples e generalizados, como é o caso do escrutínio próximo da decodificação e de respostas a perguntas abertas de questionários cujo conteúdo é avaliado rapidamente por temas.”

A análise de conteúdo, como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, apesar de poder ser considerada como um instrumento de análise, é marcada por uma grande diversidade de formas e é adaptável a um campo de aplicação muito vasto, ou seja, o campo das comunicações. A análise de conteúdo pode ser uma análise dos ‘significados’, como na análise temática, ou uma análise de ‘significantes’, como na análise léxica.

Hoje, de acordo com Bardin (1977), a análise de conteúdo é definida como:

“Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.”

Ferreira (2003), a partir da abordagem de Bardin, relaciona as possibilidades de uso da análise de conteúdo:

“A análise de conteúdo é usada quando se quer ir além dos significados, da leitura simples do real. Aplica-se a tudo que é dito em entrevistas ou depoimentos ou escrito em jornais, livros, textos ou panfletos, como também a imagens de filmes, desenhos, pinturas, cartazes, televisão e toda comunicação não verbal: gestos, posturas, comportamentos e outras expressões culturais.”

A tabela abaixo (Tabela 1), extraída de Bardin (1977, p. 35) resume as possibilidades de aplicação da análise de conteúdo.

Tabela 1 – Domínios da análise de conteúdo

De acordo com Bardin (1977), a intenção da análise de conteúdo é:

“A inferência de conhecimentos relativos às condições de produção (ou, eventualmente, de recepção), inferência esta que recorre a indicadores (quantitativos ou não).
(...)
Se a descrição (a enumeração das características do texto, resumida após tratamento) é a primeira etapa necessária e se a interpretação (a significação concedida a estas características) é a última fase, a inferência é o procedimento intermediário que vem permitir a passagem explícita e controlada de uma à outra.”

Estas inferências procuram esclarecer as causas da mensagem ou as conseqüências que a mensagem pode provocar.

Para que possa realizar a sua função de análise das mensagens, a análise de conteúdo conta com a lingüística e com as técnicas documentais, apesar de construir para si um campo próprio de investigação. O objeto da lingüística é a língua, no que se refere ao seu uso coletivo e virtual (como possibilidades de uso) da linguagem; já a análise de conteúdo tem como objeto a palavra, no que se refere ao aspecto individual e atual (em ação) da linguagem. Para Bardin (1977), “a análise de conteúdo é uma busca de outras realidades através das mensagens”. No que se refere às técnicas documentais, o autor afirma que se suprimirmos da análise de conteúdo a inferência, ficando-nos limitados à análise categorial ou temática, teremos uma identificação muito grande entre as duas formas de tratarmos o dado de pesquisa. Porém, apesar das semelhanças aparentes, existem algumas especificidades de cada uma das abordagens, como resumido na Tabela 2:

Tabela 2 – Análise Documental X Análise de Conteúdo

Análise Documental

Análise de Conteúdo

Trabalha com documentos

Trabalha com mensagens (comunicações)

Classificação-indexação

Categorial-temática (é apenas uma das possibilidades de análise)

Objetivo: representação condensada da informação para consulta e armazenagem

Objetivo: é a manipulação de mensagens (conteúdo e expressão desse conteúdo) para evidenciar os indicadores que permitam inferir sobre uma outra realidade que não a da mensagem

A análise de conteúdo se organiza em três momentos:

Na pré-análise se organiza o material, que constitui o CORPUS da pesquisa. Na exploração do material há três etapas: a) a escolha das unidades de contagem, b) a seleção das regras de contagem e c) a escolha de categorias. O tratamento dos resultados compreende a inferência e a interpretação.

Ferreira (2003) traz o percurso do trabalho com dados de pesquisa a partir da perspectiva da análise de conteúdo:

· Pré-análise

- Este momento é o de organizar o material, de escolher os documentos a serem analisados, formular hipóteses ou questões norteadoras, elaborar indicadores que fundamentem a interpretação final.
- Inicia-se o trabalho escolhendo os documentos a serem analisados. No caso de entrevistas, elas serão transcritas e a sua reunião constituirá o CORPUS da pesquisa. Para tanto, é preciso obedecer às regras de:

- exaustividade – deve-se esgotar a totalidade da comunicação, não omitir nada;
- representatividade – a amostra deve representar o universo;
- homogeneidade – os dados devem referir-se ao mesmo tema, serem obtidos por técnicas iguais e colhidos por indivíduos semelhantes,
- pertinência – os documentos precisam adaptar-se ao conteúdo e objetivo da pesquisa;
- exclusividade – um elemento não deve ser classificado em mais de uma categoria.

- O primeiro contato com os documentos se constitui no que Bardin (1979) chama de "leitura flutuante". É a leitura em que surgem hipóteses ou questões norteadoras, em função de teorias conhecidas.
- Através da leitura flutuante, surgem as primeiras hipóteses e objetivos do trabalho. Hipótese é uma explicação antecipada do fenômeno observado, uma afirmação provisória, que nos propomos verificar. O objetivo geral da pesquisa é sua finalidade maior, de acordo com o quadro teórico que embasa o conhecimento. Nem sempre as hipóteses são estabelecidas na pré-análise, afirma Bardin (1979); elas podem surgir, assim como as questões norteadoras, no decorrer da pesquisa.
- Após a leitura flutuante deve-se escolher índices, que surgirão das questões norteadoras ou das hipóteses, e organizá-los em indicadores.
- Os temas que se repetem com muita freqüência podem ser índices – e "se recortam do texto em unidades comparáveis de categorização para análise temática e de modalidades de codificação para o registro dos dados"(op.cit.).
- A preparação do material se faz pela "edição" das entrevistas transcritas, dos artigos recortados, das questões anotadas em fichas. A organização do material se realiza em colunas, com vazios à esquerda e à direita, para anotar e marcar semelhanças e contrastes. Pode-se usar lápis colorido, para sublinhar as semelhanças com a mesma cor. Naturalmente, estes procedimentos dependem dos interesses do pesquisador e dos objetivos que o levam a realizar a pesquisa.

· Exploração do material

- Esta é a etapa mais longa e cansativa. É a realização das decisões tomadas na pré-análise. É o momento da codificação – em que os dados brutos são transformados de forma organizada e "agregadas em unidades, as quais permitem uma descrição das características pertinentes do conteúdo", segundo Holsti, apud Bardin (1979: 104).
- A codificação compreende a escolha de unidades de registro, a seleção de regras de contagem e a escolha de categorias.

- a escolha de unidades de registro (recorte);

· Unidade de registro é a unidade de significação a codificar. Pode ser o tema, palavra ou frase. Recorta-se o texto em função da unidade de registro.
· Tema é a afirmação de um assunto. Como unidade de registro, é a unidade que se liberta naturalmente do texto analisado.
· Todas as palavras podem ser levadas em consideração como unidades de registro. Serão palavras-chave; palavras-tema; palavras plenas ou vazias; categorias de palavras: substantivos, adjetivos, verbos, e etc.
· O personagem pode ser escolhido como unidade de registro: traços de caráter, status social, papel, etc.
· Se o acontecimento for tomado como unidade de registro, o recorte se fará em unidades de ação, nos casos de filmes, contos, relatos, lendas, etc.
· O documento serve como unidade de registro quando a idéia principal de um livro, um relato, uma entrevista é suficiente para o objetivo desejado.
· Para estabelecer as unidades de registro, é preciso, às vezes, fazer referência ao contexto da unidade que se quer registrar. Então, o contexto serve para compreender a unidade de registro.

- a seleção de regras de contagem (enumeração);

· a presença de elementos pode ser significativa.
· a ausência pode significar bloqueios ou traduzir vontade escondida, como acontece, freqüentemente, nos discursos dos políticos;
· a freqüência com que aparece uma unidade de registro denota-lhe importância. Se consideramos todos os itens de mesmo valor, a regularidade com que aparece será o que se considera mais significativo.
· a intensidade será medida através dos tempos do verbo (condicional, futuro, imperativo), dos advérbios de modo, adjetivos e atributos qualificativos;
· a direção será favorável, desfavorável ou neutra. Os pólos direcionais podem ser: positivo ou negativo, bonito ou feio (critério estético), pequeno ou grande (critério de tamanho).
· a ordem de aparição das unidades de registro é possível ser decisiva. Por exemplo, se o sujeito A está em primeiro lugar e o sujeito D em último, pode ter significado importante.
· A co-ocorrência é a presença simultânea de duas ou mais unidades de registro. Este fato nos mostra a distribuição dos elementos e sua associação.

- a escolha de categorias (classificação e agregação).

· A maioria dos procedimentos de análise qualitativa organiza-se em torno de categorias.
· A categoria é uma forma geral de conceito, uma forma de pensamento. As categorias são reflexo da realidade, sendo sínteses, em determinado momento, do saber. Por isso, se modificam constantemente, assim como a realidade.
· Na análise de conteúdo, as categorias são rubricas ou classes que reúnem um grupo de elementos (unidades de registro) em razão de características comuns.
· Para escolher categorias pode haver vários critérios: semântico (temas), sintático (verbos, adjetivos, pronomes), léxico (juntar pelo sentido das palavras, agrupar os sinônimos, os antônimos), expressivo (agrupar as perturbações da linguagem, da escrita).
· A categorização permite reunir maior número de informações à custa de uma esquematização e assim correlacionar classes de acontecimentos para ordená-los. A categorização representa a passagem dos dados brutos a dados organizados.
· Na atividade de agrupar elementos comuns, estabelecendo categorias, seguem-se duas etapas: inventário (isolam-se os elementos comuns) e classificação (repartem-se os elementos e impõem-se certa organização à mensagem).
· Para categorizar, podem empregar-se dois processos inversos: tendo estabelecido o sistema de categorias, baseado em hipóteses teóricas, repartem-se os elementos à medida em que são encontrados; é o procedimento de "caixas", conforme Bardin (1979:119); as categorias emergem da classificação analógica dos elementos, surgem da análise do trabalho; é o procedimento por "milha", para Bardin.
· Para serem consideradas boas, as categorias devem possuir certas qualidades: exclusão mútua – cada elemento só pode existir em uma categoria; homogeneidade – para definir uma categoria, é preciso haver só uma dimensão na análise; pertinência – as categorias devem dizer respeito às intenções do investigador, aos objetivos da pesquisa às questões norteadoras, às características da mensagem, etc.; objetividade e fidelidade – se as categorias forem bem definidas, se os índices e indicadores que determinam a entrada de um elemento numa categoria forem bem claros, não haverá distorções devido à subjetividade dos analistas; produtividade – as categorias serão produtivas se os resultados forem férteis em inferências, em hipóteses novas, em dados exatos.

· Tratamento dos resultados

- A inferência se orienta por diversos pólos de atenção, que são os pólos de atração da comunicação. Numa comunicação há sempre o emissor e o receptor, os pólos de inferência propriamente ditos, além da mensagem e o seu suporte, ou canal.

- O emissor é o produtor da mensagem. É um indivíduo ou um grupo de indivíduos. A mensagem que ele emite, representa-o.
- O receptor pode ser um indivíduo. Assim, o estudo da mensagem pode fornecer dados sobre o público a que ela se destina.
- A mensagem é o ponto de partida de qualquer análise. Na análise da mensagem, é possível estudar o continente ou o conteúdo, ou os significantes ou os significados, ou o código ou a significação.
- O canal, o meio, o instrumento, o suporte material do código, serve mais para procedimentos experimentais do que para análise de conteúdo.

- Ao se descobrir um tema nos dados, é preciso comparar enunciados e ações entre si, para ver se existe um conceito que os unifique.
- Quando se encontram temas diferentes, é necessário achar semelhanças que possa haver entre eles.
- A proposição é um enunciado geral baseado nos dados. Enquanto os conceitos podem ou não se ajustar, as proposições são verdadeiras ou erradas, mesmo que o pesquisador possa ou não ter condições de demonstrá-lo. O certo é que as proposições derivam do estudo cuidadoso dos dados.
- Durante a interpretação dos dados, é preciso voltar atentamente aos marcos teóricos, pertinentes à investigação, pois eles dão o embasamento e as perspectivas significativas para o estudo. A relação entre os dados obtidos e a fundamentação teórica é que dará sentido à interpretação.
- As interpretações a que levam as inferências serão sempre no sentido de buscar o que se esconde sob a aparente realidade, o que significa verdadeiramente o discurso enunciado, o que querem dizer, em profundidade, certas afirmações, aparentemente superficiais.

- Bardin (1977) apresenta as possíveis técnicas utilizadas na análise de conteúdo: análise categorial, análise de avaliação, análise da enunciação, análise da expressão, análise das relações e análise do discurso.

Um discurso é determinado pelas condições de produção e pelo sistema lingüístico ao qual está submetido. Conhecendo-se essas suas esferas de um discurso, pode-se compreender o processo de produção de um discurso. “O discurso está situado não só pelo referente como pela posição do emissor nas relações de força e também pela sua relação com o receptor. O emissor e o receptor do discurso correspondem a lugares determinados na estrutura de uma formação social”. (Bardin, 1977)

Então, o objetivo de uma análise do discurso é descobrir as relações existentes entre o exterior e o próprio discurso. A técnica da análise do discurso também envolve operações de desmembramento e de classificação de suas unidades de registro (classificações semântica, sintática e lógica, simultaneamente). Os operadores de ligação também são considerados e desempenham um papel importante na análise.

A análise de conteúdo possibilita que uma ‘leitura profunda’ das comunicações ocorra, indo além da ‘leitura aparente’. O papel do analista é semelhante ao do arqueólogo, do detetive ou do psicoterapeuta. Freud já nos falava da ‘linguagem oculta’, Vygotsky (2000) nos diz:

“Para compreender a fala de outrem não basta entender as suas palavras – temos que compreender o seu pensamento. Mas nem mesmo isso é suficiente – também é preciso que conheçamos a sua motivação. Nenhuma análise psicológica de um enunciado estará completa antes de se ter atingido esse plano.”

Lembramo-nos do excelente filme Mente Brilhante, onde um pesquisador, em seu delírio, é contratado pelo governo americano para decifrar mensagens de guerra ‘escondidas’ em notícias e anúncios de jornal. Que magnífico exemplo da aplicação da análise de conteúdo!

 

Referências Bibliográficas

Bardin, L. (1977). Análise de Conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70
Ferreira, B. Análise de Conteúdo. http://www.ulbra.br/psicologia/psi-dicas-art.htm em 18/01/03
Moreira, E. Análise de Conteúdo: duas perspectivas metodológicas para interpretação de variáveis qualitativas e quantitativas. http://www.funesc.com.br/engenho2/textos/ecul_x02.htm em 18/01/03
Vigotski, L. S. (2000). Pensamento e linguagem. - 2a. ed. – São Paulo: Martins Fontes